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Sobre a Autora 

Fátima Diniz Castanheira é advogada em São Paulo, especializada em Direito dos Contratos e pesquisadora independente da previdência complementar patrocinada – fundos de pensão.

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Conselho fiscal foi neutralizado. Participação dos trabalhadores nos fundos de pensão é letra morta

O Conselho Fiscal, órgão responsável pelo controle, fiscalização e aprovação das contas, integrado por participantes eleitos pelos trabalhadores, foi neutralizado por auditorias independentes, instituídas de forma discutível no dia 6 de dezembro de 2017. Além de perder o controle, os participantes serão onerados com mais essa despesa com a contratação de auditores independentes.


Os fundos de pensão estão mergulhados em déficits bilionários que, em 2017 atingiram R$ 77,6 bilhões, em mais de 220 fundos deficitários. Os descontos compulsórios para equacionamento do déficit já atingiram patamares absurdos como no caso do fundo Petros, da Petrobrás cuja alíquota chegou a inaceitáveis 74,69% por mês nos holerites dos aposentados. É um dano previdenciário histórico.


1. Conselho fiscal foi neutralizado por um Comitê de Auditoria


Em 06.12.2017, após constatação dos déficits bilionários, o Conselho Nacional de Previdência Complementar - CNPC resolveu agir. Estabeleceu um novo sistema de fiscalização para os fundos de pensão denominado Comitê de Auditoria, segundo critérios de "porte" e "relevância estabelecido pela Previc, formado por um grupo de 3 (três) a 5 (cinco) integrantes, com mandato de 3 (três) anos.


O CNPC deu prazo até 31.12.2018, para os fundos de pensão que estejam enquadrados nos critérios da Previc, de relevância e porte, se adequarem ao novo sistema. Transcrevemos os principais artigos dessa norma[1]:

Resolução CNPC nº 27 de 06.12.2017:

Art. 3º As EFPC devem contratar auditor independente, pessoa física ou jurídica, registrado na Comissão de Valores Mobiliários - CVM e que atendam aos requisitos mínimos fixados nesta resolução e nas normas complementares da Superintendência Nacional de Previdência Complementar - Previc que disponham sobre o tema.

. . . . .

Art. 5º As EFPC devem designar diretor responsável pela contabilidade para responder, junto à Previc, pelo acompanhamento, supervisão e cumprimento das normas e procedimentos de contabilidade previstos na regulamentação em vigor.

Parágrafo único. O diretor responsável pela contabilidade será responsabilizado pelas informações prestadas e pela ocorrência de situações que indiquem fraude, negligência, imprudência ou imperícia no exercício de suas funções, sem prejuízo da aplicação das penalidades previstas na legislação em vigor.

. . . .

Art. 8º As EFPC definidas pela Previc com base em critérios objetivos, que levem em consideração porte e relevância, devem constituir Comitê de Auditoria.

§ 1º O prazo para constituição do Comitê de Auditoria é até 31/12/2018.

. . . .

Art. 9º O Comitê de Auditoria deverá ser composto por no mínimo 3 (três) e no máximo 5 (cinco) integrantes, com mandato de 03 (três) anos.

§ 1º Os critérios de nomeação, destituição, remuneração, bem como as atribuições do Comitê de Auditoria, deverão estar expressos em regulamento próprio aprovado pelo Conselho Deliberativo.

§ 2º Pelo menos um dos integrantes do Comitê de Auditoria deverá possuir comprovados conhecimentos nas áreas de contabilidade e auditoria contábil de EFPC.

. . . . .

Art. 17 O diretor responsável pela contabilidade, o auditor independente e o Comitê de Auditoria devem, individualmente ou em conjunto, no prazo de até 10 (dez) dias úteis contados do conhecimento do fato, comunicar formalmente à Previc a existência de:

I - inobservância de normas legais e regulamentares que coloquem em risco a continuidade das EFPC e dos planos de benefícios operados por estas;

II - fraudes de qualquer valor perpetradas pela administração das EFPC;

III - fraudes relevantes perpetradas por funcionários das EFPC ou por terceiros; e

IV - erros que resultem em incorreções relevantes nas demonstrações contábeis das EFPC.

Parágrafo único. A Diretoria Executiva das EFPC deverá comunicar formalmente ao auditor independente e ao Comitê de Auditoria, quando instalado, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas da identificação, a ocorrência dos eventos referidos neste artigo.

O novo sistema de fiscalização onerou os participantes com a contratação de 3 a 5 profissionais, cujo salário será definido pelo patrocinador através do Conselho Deliberativo, mas pago por eles. Mais uma vez, a conta recaiu sobre os participantes.


Essa Resolução nº 27 neutralizou o Conselho Fiscal, que era formado por conselheiros eleitos pelos participantes do fundo, na forma prevista em lei. Além disso, na medida em que delegou poderes ao Conselho Deliberativo, colocou nas mãos do patrocinador a escolha dos integrantes desse comitê. Vale lembrar que no conselho Deliberativo predomina o Voto de Minerva patronal.


1.1. Previc define as Entidades Sistemicamente Importantes (ESI)


Em maio/2017, a Previc já havia selecionado pelo critério de relevância e porte, 17 (dezessete) fundos de pensão considerados por ela como Entidades Sistemicamente Importantes (ESI), seja por ter déficit bilionário; seja por estar entre as maiores do país. São elas: Petros (Petrobrás), Postalis (Correios), Funcef (Caixa Econômica Federal) ,Previ (Banco do Brasil), Fapes (BNDES), Sistel (Oi, Tim, Telefonica), Real Grandeza (Furnas), SP-Prevcom (servidores públicos do Estado São Paulo), Valia (Vale do Rio Doce), Banesprev (Banespa), Fundação Copel, Funcesp, Fatl, Forluz, Funpresp-Exe (Fundação de Previdência Complementar dos Servidores Públicos da União - poder Executivo), Funpresp-Jud (Fundação de Previdência Complementar dos Servidores Públicos da União - Poder Judiciário) e Itaú Unibanco [2].


2. Críticas da Anapar às normas do CNPC e da Previc


A Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão – Anapar é entidade que representa os participantes dos fundos de pensão no CNPC, de forma minoritária entre 7 (sete) entidades governamentais e patronais. Além de votar contra, a Anapar teceu duras críticas aos novos rumos dados à fiscalização dos fundos de pensão no país.


2.1. Críticas da Anapar à Resolução nº 27 do CNPC


Dada a importância da matéria, transcrevemos na íntegra o boletim da Anapar - Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão – Anapar[3]:


CNPC esvazia atribuições do Conselho Fiscal

No último dia 6 de dezembro, o Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) aprovou, com o voto contrário da Anapar, da Abrapp e dos representantes dos Patrocinadores e Instituidores, resolução disciplinando a contratação de auditoria independente.


A Resolução também cria um Comitê de Auditoria com competências bem similares aos dos atuais conselhos fiscais dos fundos de pensão e determina que as entidades de previdência devam indicar um diretor responsável pela sua contabilidade. Além disso, a Resolução determina também que esse Diretor e o Comitê de Auditoria denunciem diretamente à Previc, sem passar por nenhuma instância decisória da Fundação, qualquer possível irregularidade.


A Resolução estabelece que o conselho deliberativo das entidades aprovará o regulamento do Comitê de Auditoria, que deverá “traduzir” os critérios para composição, nomeação e remuneração dos membros e atribuições do Comitê.


A resolução será normatizada por instrução da Previc, da qual já tivemos conhecimento da minuta. Segundo a minuta da instrução, os membros do Comitê de Auditoria não poderão ser membros da diretoria executiva, do conselho deliberativo, do conselho fiscal e nem pertencer ao quadro de pessoal da entidade. Ou seja, deverão ser contratados no mercado, ou poderão ser empregados das patrocinadoras? Também questionamos qual será, de fato, o campo de ação do conselho deliberativo a partir da instrução da Previc.


A Anapar sempre defendeu a ampla transparência, controles efetivos e a democratização na gestão das entidades fechadas de previdência, como forma de garantir a sustentabilidade dos planos de benefícios, a credibilidade do sistema e, em última análise, para garantir o resultado final esperado pelos participantes. Assim sendo, a criação dos Comitês de Auditoria, poderia ser muito bem vinda e bem recebida pelo segmento, se houvesse a sensibilidade dos representantes do governo de acolher diversas ponderações trazidas pelos representantes da sociedade civil.


No entendimento de Cláudia Muinhos Ricaldoni, representante dos participantes e assistidos no CNPC, “a Resolução aprovada no dia 06/12 pelo Conselho Nacional de Previdência Complementar – CNPC, que poderia representar um avanço nas boas práticas de governança, infelizmente, por incompreensão dos representantes do governo, vem em sentido contrário”. Claudia destaca que, ao criar a figura de um diretor responsável pela contabilidade para responder junto à Previc, pelo acompanhamento, supervisão e cumprimento das normas e procedimentos de contabilidade previstos na regulamentação em vigor, transfere para um único dirigente uma responsabilidade que é solidária de toda a Diretoria Executiva. Centraliza algo que é, pela natureza das entidades, de decisão colegiada. Resta saber se esse diretor responsável pela contabilidade deverá ser obrigatoriamente contador.


“Ao criar o Comitê de Auditoria com atribuições muito semelhantes às dos conselhos fiscais, a resolução extrapolou seu poder normativo e invadiu matéria que é expressamente prevista na Lei Complementar n.º 108/01, criando de fato, mas não de direito, mesmo porque ainda não chegamos a esse absurdo, mais uma instância de poder para as Fundações, esvaziando por completo os Conselhos Fiscais”, afirma a representante dos participantes.


Conforme expresso na LC 108/01, o conselho fiscal é órgão de controle interno de extrema relevância para as entidades fechadas e atua como fiscal dos atos praticados pela diretoria e pelo conselho deliberativo. Porém, com a nova resolução, restará aos membros do conselho fiscal tão somente emprestar o seu CPF para as homologações de praxe.

A Anapar chegou a propor na reunião do CNPC que o Comitê de Auditoria fosse órgão auxiliar ao conselho fiscal, dotando aquele colegiado de ferramentas mais eficientes para o exercício de suas atribuições. A sugestão não foi aceita e o texto da Resolução aprovado sai em sentido contrário: esvaziar o conselho fiscal. Resta saber se a Previc vai manter a proposta e composição do Comitê de Auditoria que consta da atual minuta de Instrução delegando a terceiros, por vezes estranhos ao contrato previdenciário, a responsabilidade e o poder de fiscalizar as entidades de previdência complementar.


Vale lembrar que a obrigatoriedade de criação dos Comitês de Auditoria é somente para as 17 entidades classificadas pela Previc como “importantes e relevantes”. O órgão fiscalizador retirou do texto da resolução o termo “Entidades Sistemicamente Importantes – ESI”, ainda que tenha mantido o conceito. Segundo a Previc, a alteração foi feita para evitar problemas jurídicos já que não existe na Legislação de Previdência e nem em Resolução emanada do CNPC essa classificação, estabelecida por instrução normativa da Previc, usurpando competência do Legislativo que aprovou as LC 109/2001, 108/2001 e a lei 12.154/09.


No nosso entendimento, e parece que também no entendimento envergonhado da Previc, é que a Instrução Normativa que criou o conceito de ESI, extrapola a competência legal da autarquia para definir o escopo de sua atuação. Além disto, essa Instrução da Previc divide o sistema em dois: as entidades importantes e que não podem “quebrar” e as outras. Do ponto de vista dos participantes são todas importantíssimas e deve receber por parte do estado, a mesma atenção e cuidado. É assim que define a Lei e é assim que os participantes entendem, pois todos ajudam a financiar a Autarquia por meio da TAFFIC, taxa cobrada de todas as entidades e que incide sobre o custeio administrativo de todas as entidades.


Em toda a reunião os defensores da resolução afirmaram se tratar de um avanço significativo nos quesitos de governança e transparência, estando alinhada às melhores práticas do sistema financeiro e bancário. Resta uma pergunta e um esclarecimento: Se for tão bom e se o objetivo é proteger mais os participantes, por que ficar restrita apenas às 17 fundações?


Reafirmamos nossa opinião, que a resolução deveria ter dotado os conselhos fiscais de reais instrumentos para que exercessem com eficiência as atribuições que a lei lhes confere e não esvaziar suas atribuições.


A previdência complementar no Brasil está inserida no capítulo dos Direitos Sociais e não no capítulo Econômico. O fato de terem acabado com o Ministério da Previdência, por si, só não altera a Constituição Federal. Boas práticas do sistema financeiro ou em qualquer outro sistema devem ser analisadas e trazidas para o âmbito da Previdência Complementar com muito cuidado e parcimônia, tendo a preocupação de entender que se trata de um contrato privado entre partes, conforme também define nossa Lei Maior.


2.2. Críticas da Anapar à Instrução Normativa nº 15 da Previc


Em 08.12.2017, a Previc editou a Instrução Normativa nº 15, estabelecendo o que chamou de "medidas prudenciais preventivas destinadas a assegurar a solidez, a estabilidade e o regular funcionamento do Regime de Previdência Complementar".


Eis um trecho da manifestação da Anapar sobre a supracitada IN nº 15 da Previc[4]:


Anapar questiona legitimidade de exigências da Previc para habilitação de dirigentes

A Instrução Normativa nº 15, publicada pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) no dia 8 de dezembro, enrijeceu ainda mais as normas do órgão com relação aos dirigentes dos fundos de pensão. Segundo o advogado e doutorando em direito previdenciário Fabiano Silva dos Santos, a instrução estabeleceu requisitos que desrespeitam o que está na lei. Fabiano afirma que existe um conflito sobre o entendimento do termo “conduta ilibada”. “A Previc não determinou um alcance para essa exigência”, critica.


A vice-presidente da Anapar Claudia Ricaldoni, ressalta que as instruções editadas pela Previc restringem o poder dos participantes. “As exigências da Previc resultaram numa segregação e exclusão dos participantes a partir do momento em que o órgão governamental pode afastar dirigentes quando bem entender, inclusive os eleitos pelos trabalhadores”, afirma a dirigente da Anapar, que também é membro do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), instância máxima de regulação do setor, onde, como lembra Claudia Ricaldoni, as medidas propostas na instrução da Previc não foram debatidas.


Para ser dirigente ou conselheiro de um fundo de previdência privada fechada é necessário habilitação pela Previc, medida adotada pelo órgão para prevenir problemas de gestão. Uma das exigências do órgão supervisor é a chamada conduta ilibada, conceito subjetivo e passível a diferentes interpretações.


Conduta ilibada significa que a pessoa tem um comportamento correto, que não comete ações fora da lei. É exigência para concursos públicos da área jurídica, e de alguns outros cargos em esferas federais, estaduais e municipais, porém, a Anapar questiona o entendimento do conceito para efeitos de manutenção do cargo. O advogado Fabiano Silva dos Santos defende o posicionamento da Associação e demonstra que, de acordo com as novas medidas da Previc, o simples fato de o dirigente responder a um processo administrativo já seria suficiente para o afastamento do cargo.


“A postura da Previc, na verdade é ilegal, pois vai além do que estabelece a LC 108 e 109 ao trazer requisitos que restringem ainda mais o ingresso ou manutenção do dirigente. Não pode uma instrução normativa retirar direitos que a lei tratou. Uma mudança dessa magnitude deve vir da instância correta: o Congresso Nacional”, conclui o advogado (Grifos nossos).


O assunto não é novo. Desde outubro de 2017, a Anapar já vinha alertando sobre essa ofensiva contra os direitos dos participantes, como demonstrado neste blog na matéria intitulada “Mais uma investida contra os participantes de fundos de pensão”, de 17 de outubro de 2017.


Não resta dúvida que o sistema de Previdência Complementar precisa ser totalmente reestruturado. É preciso sanar as falhas estruturais demonstradas neste blog, assim como sanar as falhas da fiscalização, mas sem onerar e sem retirar o controle dos participantes, ou seja, mantendo o poder do conselho fiscal previsto em lei.


Atualizado em 01.05.2018.

 

[2] Previc aprimora Supervisão Prudencial e dispõe sobre Entidades Sistemicamente Importantes e procedimentos para habilitação de dirigentes. Previc, 29/maio/2017. Disponível em: http://www.previc.gov.br/central-de-conteudos/Noticias/previc-aprimora-supervisao-prudencial-e-dispoe-sobre-entidades-sistemicamente-importantes-e-procedimentos-para-habilitacao-de-dirigentes Acesso em 30.04.2018.

[3] CNPC esvazia atribuições do Conselho Fiscal. Anapar, 8/dez/2017, em Comunicados Disponível em: http://www.anapar.com.br/?p=29689 Acesso em 09.02.2018.

[4] Anapar questiona legitimidade de exigências da Previc para habilitação de dirigentes. Anapar, 21/dez/2017, em Boletins. Disponível em: http://www.anapar.com.br/anapar-questiona-legitimidade-de-exigencias-da-previc-para-habilitacao-de-dirigentes/

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